sexta-feira, 24 de dezembro de 2004

O tão falado Natal



24/12/2004

O tão falado Natal

Natal me lembra minha infância. Aquela árvore enorme cheia de presentes embaixo, dos quais apenas um ou dois seriam meus. Fartura, uma mesa cheia de nozes, avelãs, amêndoas, o quebra-nozes, tâmaras (que eu não gostava), uma bancada repleta de frutas frescas, cheiro de panetone. Hum, não gosto de panetone, do tradicional. Lembro da primeira vez que comi aquelas frutinhas cristalizadas do panetone, uma sensação ruim de morder aqueles pedacinhos meio duros e doces demais.

Lembro daquela mesa cheia de cadáveres de animais, um pobre leitão esturricado com uma maçã na boca, um frango grande sem cabeça e decorado com fios de ovos, uma perna de não sei que bicho, toda quadriculada à faca. Pobres animais.

Papai Noel... aquele velhinho mágico que chegava trazendo presentes para as crianças, e que depois descobri que era sempre o pai de alguém fantasiado... onde estava o meu Papai Noel...

Musiquinhas de Natal, sons de harpas, corais multifônicos, melodias ancestrais.

Presépio. Menino Jesus, Virgem Maria e São José... Eu não compreendia como podia aquele boneco de cera deitadinho em um berço de madeira provocar tanta comoção e atitude reverencial nas pessoas.

Natal sempre vai me lembrar essa época remota. E sempre vou lembrar também da noite de Natal que fui com minha prima para um quarto escuro da casa e ficamos debruçadas na janela, chorando por todos aqueles que dormiam nas ruas, por todas as crianças de quem Papai Noel havia se esquecido, de todos aqueles que jamais viriam uma árvore cheia de presentes, jamais quebrariam uma noz e tampouco experimentariam um Peru decorado com fios de ovos, e que provavelmente revirariam o lixo no dia seguinte, dia de Natal, vendo o que o Papai Noel lhes havia deixado dentro daqueles sacos pretos.

Hoje cada vez que se aproxima o fim do ano e o vermelho começa a tomar conta da decoração da cidade tenho vontade de sumir daqui. Vejo as pessoas enlouquecendo em torno da expectativa do dia que se aproxima, a corrida aos presentes, os amigos secretos, a luzes coloridas pipocando nas árvores e nas fachadas, os jornais anunciando as ofertas típicas, cestas de natal. Caixinha, o entregador de jornal, o lixeiro, o porteiro, o motoboy. Na última hora comprar o presentinho da filha da irmã da moça que trabalha na casa da cunhada...

Natal... E Jesus, dizem, nasceu lá, quietinho, no meio do deserto, cercado pelos bois e carneiros...

Provavelmente pouco tinham para comer.

Alguma coisa tá errada nesse mundo, e me dói pensar que sou eu...

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